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Congresso derruba parte do veto de Lula e restabelece marco temporal para terras indígenas

Veto ao marco temporal foi derrubado em parte
Joédson Alves/Agência Brasil — Arquivo

O Congresso Nacional derrubou na tarde desta quinta-feira (14) uma parte do veto presidencial ao projeto de lei do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Em outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou trechos da proposta, incluindo o principal artigo, que diz que uma terra só pode ser demarcada se for comprovado que os indígenas estavam nela ou disputavam a posse dela na data da promulgação da Constituição — 5 de outubro de 1988. Essa parte voltou para o texto.

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Na Câmara, 321 deputados votaram pela derrubada, contra 137 pela manutenção e uma abstenção. Já no Senado, foram 53 votos contra a decisão de Lula e 19 a favor.

Apesar de a maioria dos trechos vetados por Lula terem voltado para o texto, o governo conseguiu articular a manutenção de alguns vetos. Ficaram de fora a permissão para pesquisa de transgênicos em terras indígenas, a retomada de terras demarcadas em razão de alterações de traços culturais e a autorização para o contato com comunidades que vivem isoladas.

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Líder da oposição no Senado, o senador Rogério Marinho (PL-RN) sustentou que o projeto “dá previsibilidade e segurança jurídica ao país”. Esse é o principal argumento trazido pela bancada ruralista para apoiar a tese.

Na outra ponta, a líder do PSOL, a deputada indígena Célia Xakriabá (MG), rebateu o argumento de que a tese traz segurança jurídica. “Não se trata de uma tese somente jurídica. É uma tese política, econômica. Comprovadamente, quando se diz que tem 500 fazendas, inclusive de parlamentares de olho nas nossas terras indígenas, é nesse momento que a economia vai perder. O mercado internacional não vai comprar produto que vem de terras indígenas, que viola direitos humanos, que fomenta o trabalho escravo”, sustentou.

A base do governo já anunciou que vai judicializar o projeto, sustentando inconstitucionalidade. O movimento gerou críticas por parte da oposição. “Isso tem sido recorrente: uma instância subsequente à decisão do Congresso. Como se o judiciário, o Supremo Tribunal Federal, sempre fosse uma espécie de linha auxiliar do governo ou daqueles que se julgam prejudicados pela vontade popular expressa pelo Parlamento legitimamente eleito. Está na hora de parar com esse tipo de situação”, disse Marinho.

Entenda o que decidiu o Supremo

O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu em setembro o julgamento que derrubou a aplicação da tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas no país. A decisão afeta processos de reconhecimento em discussão no governo federal e nas instâncias da Justiça. Os ministros decidiram, por 9 a 2, que não cabe aplicar aos processos de demarcação a regra do marco temporal — uma espécie de linha de corte. A medida é defendida por ruralistas e refutada pelos povos originários.

Pela tese do marco temporal, uma terra só poderia ser demarcada se fosse comprovado que os indígenas estavam nela ou disputavam a posse dela na data da promulgação da Constituição Federal vigente — 5 de outubro de 1988. Quem estivesse fora da área nessa data ou chegasse depois desse dia não teria direito a pedir a demarcação.

Segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), há 736 terras registradas no país em vários estágios de demarcação. Essas áreas somam pelo menos 13,75% do território brasileiro e estão localizadas em todas as cinco regiões do país (Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul). Destas, 477 já chegaram ao processo final — a regularização. Outras 259, entretanto, aguardam a finalização.

No recurso extraordinário, a Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (Fatma) — atual Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) — defendeu a reintegração de posse de uma área ocupada em 2009. O território é ocupado por cerca de cem indígenas, na Reserva Biológica do Sassafras, entre os municípios de Benedito Novo e Doutor Pedrinho.

O STF começou a julgar o caso em 26 de agosto de 2022, mas, em razão de pedidos de vista, só concluiu a votação no dia 21 de setembro deste ano.

O relator do caso, Edson Fachin, votou a favor dos indígenas, assim como Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Isso significa que, para eles, a demarcação de terras pode ocorrer em áreas habitadas por povos originários mesmo depois da promulgação da Constituição Federal. Segundo Fachin, o texto constitucional reconhece o direito de permanência desses povos independentemente da data de ocupação.

Moraes afirmou que o tema é uma das questões “mais difíceis” de ser enfrentadas não só no Brasil, mas no mundo todo. Conforme o ministro, a discussão é juridicamente complexa e vem causando insegurança jurídica e afetando a paz social.

Já os ministros Nunes Marques e André Mendonça foram a favor do marco temporal. Eles consideraram que os interesses dos indígenas não se sobrepõem à defesa nacional.